quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Os Incompreendidos - jovens sem rumo

O filme que vou falar hoje é um marco no cinema mundial. Os incompreendidos (Les quatre cents coups, 1959), de François Truffaut, é o primeiro grande sucesso da chamada Nouvelle vague francesa, movimento cinematográfico liderado por jovens diretores, alguns deles ex-críticos de cinema, cansados da mesmice hollywoodiana, cheios de ideias e afoitos por levar ao cinema um modernismo e uma forma totalmente nova de contar histórias, da maneira mais pessoal e intimista possível. De modesto, o movimento da nouvelle vague tomou proporções gigantes, influenciando toda a produção cinematográfica subseqüente, sobretudo ao encher de inspiração os jovens diretores que viriam a fazer a revolução do cinema americano, como Martin Scorsese e Francis Ford Coppola.
François Truffaut foi um dos líderes do movimento e um dos mais criativos diretores que já viveram. Isso é um fato. Sua produção é tão longa quanto diversificada e elogiada. Mas poucos filmes de Truffaut são tão bem visto ou tão emblemáticos quanto Os incompreendidos, seu primeiro trabalho.
No longa, acompanhamos o jovem Antoine Doinel (Jean-Pierre Léaud). Um rapaz de seus 13 anos, mais ou menos, que sente uma recusa em aceitar padrões de convivência sociais da maneira as quais lhe são impostos. Em Antoine, há um forte espírito transgressor, inovador e um ar indomável. Percorre as ruas de Paris divertindo-se e praticando pequenos furtos, de modo a pouco se importar com as conseqüências de seus pequenos grandes atos. De fato, no menino podemos ver uma necessidade pelo novo e uma angústia simplesmente inexplicável. Não dá pra saber ao certo o que ele quer, pois nem ele mesmo sabe. Só nos é permitido perceber o que ele não quer e isso fica muito óbvio. O que Antoine rejeita tanto é a vida a qual tentam lhe forçar a viver. De todas as memoráveis cenas do filme, as que mais se destacam são, justamente, as que escancaram essa necessidade de Antoine de se libertar das amarras sociais. Primeiro, temos um momento em que ele brinca despreocupado num parque de diversões, após fugir da escola, em que entra num brinquedo onde as pessoas devem manter-se paradas e em pé, e, em vez de seguir o padrão, o garoto se move na maior bestialidade. Outro grande momento é uma fuga. Fuga para lugar nenhum. Ele apenas sai correndo, sem destino e sem saber o que fazer a seguir ou muito menos que rumo sua vida vai tomar.
Truffaut aproveita o gancho para criticar as instituições que deveriam fazer o papel de guiar a juventude. Família e escola. Ambos são postos em cheque e ambos falham na tentativa de “arrumar” a cabeça de Antoine. Sua família é totalmente desajustada e simplesmente não dá a devida importância ou atenção a ele e na escola é julgado como um aluno incorrigível que merece apenas ser castigado. Até o próprio reformatório infantil, local que, teoricamente, foi criada para “ajustar” jovens perdidos, falha em sua missão. Claro que todos falham. Os tempos mudaram e é cada vez mais difícil controlar a inquietude da juventude.
Antoine, aliás, é baseado em experiências vividas na infância e adolescência do próprio Truffaut (não sei definir o limite entre o que aconteceu de fato e o que é ficção). Jean-Pierre Léaud, então com 15 anos de idade, tornou-se um dos principais atores do cinema francês e repetiu a parceria com Truffaut, interpretando o mesmo Antoine Doinel, em mais quatro filmes, firmando uma das melhores parcerias ator-diretor de todos os tempos no cinema.

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Lucas Moura

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