quarta-feira, 15 de junho de 2011

O Quinze

Quando se fala em sertão na Segunda Fase Modernista, todos logo se lembram de Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Não é pra menos, já que o livro descreve de maneira genial o sofrimento de uma família que luta contra a pobreza e a fome no sertão nordestino. Mas pra mim O Quinze, de Rachel de Queiroz, merece a mesma (ou até maior) notoriedade, já que retrata de maneira mais forte a problemática da seca.
A seca de 1915 aconteceu de verdade e é considerada uma das piores da história nordestina. Na época, Rachel de Queiroz era uma menina de cinco anos, e mesmo não sendo pobre, sua família também sentiu as consequências da estiagem. A seca atingiu boa parte do Nordeste, inclusive Sergipe, onde carne bovina se tornou artigo de luxo (segundo minha bisavó, só se comprava em Itabaiana) e provocou uma grande onda migratória rumo à Amazônia, que na época vivia a febre da borracha.
Os dois focos do livro são a família do vaqueiro Chico Bento e o sentimento que há entre Conceição e Vicente. Chico Bento, depois de ser demitido da fazenda onde trabalhava por falta de serviço vaga com sua mulher e seus cinco filhos pelo sertão, em busca de oportunidades. Na viagem acontecem diversos infortúnios, como o desaparecimento de um dos filhos e a morte de outro, que na agonia da fome comeu mandioca crua, indo a óbito por envenenamento.
Conceição, comadre de Chico Bento, é professora na capital e mora com sua avó, dona Inácia. Sempre nutriu um sentimento por seu primo Vicente, que tem uma fazenda no sertão e trabalha nela, sendo portanto um homem rude e sem estudo, diferente de Conceição. E essa diferença intelectual representa a distância entre os primos, que ao final do livro não tinham se entendido.
Outros fatos reforçam o lado social da obra: os Campos de Concentração onde Conceição era voluntária, em que o governo mantinha os migrantes, temendo que eles se revoltassem e promovessem uma onda de violência; e uma certa ocasião em que Chico Bento mata uma cabra achando que ela não tinha dono, mas quando este aparece o chama de ladrão e dá apenas as tripas do animal para a família do vaqueiro comer.
Rachel de Queiroz escreveu O Quinze com apenas dezenove anos, e desde então foi aclamada por público e crítica. Escreveu vários outros romances, com destaque para Dôra, Doralina e Memorial de Maria Moura, que conquistou o Brasil ao ser adaptado numa minissérie da Rede Globo. Foi a primeira mulher a entrar na Academia Brasileira de Letras (1977) e a ganhar o Prêmio Camões (1993), o prêmio mais importante da língua portuguesa.
A escritora cearence faleceu em sua casa no Rio de Janeiro, em 2003, às vésperas de completar 93 anos de idade, enquanto dormia em sua rede.

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